segunda-feira, 14 de setembro de 2020

Debalde jamais

 

De balde vazio,

desci o barranco

deslizante até o igarapé mais próximo

para recolher de lá: água...

que em mim já havia sido depositada por meus ancestrais.

 

De balde cheio,

subi ainda mais deslizante que antes

equilibrado pela cabeça que levava junto a si

um mundo de história

de caboclos da mata

que por lá sorriram e lutaram.

 

                                                                              Lfr.

sábado, 22 de agosto de 2020

Aflora teu canto


Saudar quem sozinha suporta
Ver a si na ocasião da violência invasiva
Entre amigas e amigos numa ciranda de vozes, 
Sorrir entre beijos e cortes
O prelúdio reluzente da morte decisiva


Cuidar para não ser levada
Às lembranças aos pés desnudos
Volver-se envolto na morada de um casulo
Esperança que aos céus reclama calada


Esbalda-te, ó flora querida, com teu jeito de correr o olhar
Rodopia tua opinião ao alcance das nascentes 
Para que todos saibam de o universo a semente troar
Desse que volita sorridente
a serenar a ferida do teu coração
Ao sopro do canto de sabiás 
Sonha em ti o fim e a libertação.

 
                                                                  Lfr.

sexta-feira, 12 de junho de 2020

(in)verso: O uso correto da maledicência

Definição:
Quando se julga um fato sobre o qual não reside nenhuma fagulha de incerteza ou dúvida.

Orientações para o bom uso:

Toda vez que forem proferidas a expressão "se isso for verdade", interrompa o curso "natural" do discurso e diga para si mesma: é uma virtude saber usar a maledicência. Vou aguardar.

quinta-feira, 11 de junho de 2020

Ainda Beatriz


Em frente está o passo que darei;

Contente até por me enganar pelas árvores que cantam.

Seduzindo-me, convencendo-me do oceano que havia em sua floresta.



Fui até a densidade daquele esconderijo que sabia ser eu lá algum dia.

O medo que sempre carreguei ficou, como quem perde pedaço de pano pra galhos secos
Já não tinha mais nada a perder, mas não fui corajoso por não temer...

A travessia...a travessia...

Na vida fui vencido aos poucos até que a última esperança sucumbisse, Beatriz!
Pra me dar amor!

quarta-feira, 24 de outubro de 2018

A perversão da polissemia

Em Outubro de 2018, o que é ser solidário?


A Perversão da Polissemia


Ser solidário é ter em si algo que não é só seu

Um sentimento qualquer que se solidifica ressentido

Bramindo por dentro desejo comprimido

Delírio seguro de se ver encontrado

Próprio, propício e recíproco; terno, aberto e eterno

Doença cruenta no alento reencontro

Estrondo vazio, sozinho em sem mil

Deixou de ser próximo para ser um corte longínquo

Através, atravessa cada corpo sendo também um deles o seu

Para falar de outra margem sobre cantos e prantos

E da verdade do semelhante que se demora em ser parte de mim agora.


                                                                                                                                Lfr.




segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

Estranho desejo de ser feliz




Eu quis rir e ri quando ao improviso da vida estive diante de uma formidável contradição
Que me fez ir ao ridículo estado de não saber quem realmente caiu daquela escada
O revés da tragédia foi tentar conciliar o ritmo acelerado com a vesguice congênita
Olhei de cima como se por baixo nunca estivera a soluçar de dor
A piada foi se perdendo ao longo das feições, revelando, quadro a quadro, um socorro a pedir.

O “dissaboralheio” carrega consigo contentamento,
Um estranho desejo de ser feliz
Espontâneo apego ao que não se diz ciente da contradição desfeita.

Ninguém rir de si mesmo se se entende coerente
Porém se a zombaria for, aos teus olhos, tão evidente
Por que não morrer de rir dessa troça que é o humano convicto?
Por que não rir?


É o descalabro do espectador devorado pela hiena que esperava tanto por isso. 



                                                                                                 Lfr.

sábado, 14 de janeiro de 2017

O Esconderijo Conhecido

É com frequência que ouço dizer que quando adquirimos ou estamos perto de adquirir algo que seja valioso para um determinado grupo, é dito termos de nos conter em divulgar a notícia da conquista alcançada. O motivo para a discrição seria nos guardar dos olhares alheios e, portanto, da natural inclinação de desejar o que todos desejam. Estaríamos diante de uma das paixões que mais promovem justiça neste mundo: a inveja.
A inveja é uma paixão humana que quer equanimizar as relações de aquisição porque as conquistas não são necessariamente resultado de um mérito próprio, não há quem possa afirmar que tudo que conquistou nesta vida é devido a sua exclusiva ação. Todos somos partícipes e por ser assim aquele que encontra alguém portando um objeto, no qual o grupo o qualificou como imprescindível, é legítimo o direito de também pertencê-lo. Obviamente que este pertencimento exige ressalvas que estão adstritas ao contexto de cada humano em tempos e espaços específicos.
Voltando a discrição, digo que os motivos pelos quais não divulgamos a notícia é, primeiro, para não partilhar a informação de que se está portando por ser ela o que há de mais valioso para o grupo em questão. O que se quer é esconder o ouro para que o benefício contingenciado pelos desígnios de outras Ordens esteja no poder que atribui mais poderes sobre os demais.
O segundo motivo tem uma verossimilhança semântica com o termo humilhação. Se me antecipar na divulgação de uma possível conquista, porém ainda não tida como certa, posso ser surpreendido com uma negativa e ter que me diminuir depois de ter dito a todos da grandeza em meu domínio. Portanto o indivíduo se guarda de si mesmo porque sabe que ainda não suporta a humilhação que a si se impõe.

                                                                                                                 Lfr.